O unanimismo partidário em torno das propostas de política fiscal da CML – com a excepção do PAN (para pior), que se absteve na proposta de agravamento do IMI para prédios devolutos (provavelmente porque serve para abrigo dos pombos) - demonstra bem a hegemonia do discurso neoliberal em Portugal.
Do CDS ao BE todos se congratulam com os baixos impostos sobre o património (IMI) e com a redução dos impostos sobre o rendimento (IRS) que a Câmara fez no âmbito das suas competências. Mal, para a esquerda, que não devia pactuar com o discurso fácil do "roubo fiscal", mesmo que isso lhe custe umas alfinetadas de comentadores e jornalistas.
É que mesmo a "defesa de esquerda” para a descida da taxa de IMI, de que neste país, a classe trabalhadora, foi empurrada para a compra de casa própria, faz sobretudo sentido nas periferias, para onde essa classe trabalhadora foi empurrada para adquirir apartamentos em urbanizações-dormitório de má qualidade. Não tanto em Lisboa, cidade que tem zonas onde o preço por metro quadrado chega aos 4 mil euros e em que uma parte muito significativa dos habitantes, nomeadamente jovens, vive em casas arrendadas.
Sobre o IRS então nem vale a pena falar...
A pergunta que a esquerda deveria fazer era se determinado imposto é ou não progressivo. Isto é: se cobra mais aos que mais possibilidades têm ou não e, depois, como essa receita da Câmara é utilizada na Cidade.
Neste âmbito, congratular a medida porque “alivia os munícipes da brutal carga fiscal imposta pelo Governo”, é uma simplificação que embora podendo parecer, não é de esquerda.
É colocar a origem das dificuldades nos impostos pagos por “todos nós, os munícipes”, esquecendo que no que diz respeito ao pagamento de impostos, o que não falta em Lisboa são munícipes que pagam muito, mas muito pouco, face às suas possibilidades enquanto há outros que pagam e de que maneira!
Do debate parece ter ficado arredado o grave problema financeiro estrutural da capital do país, que é habitada por mero meio milhão de pessoas, mas que é utilizada e tem responsabilidades perante muitas e muitas mais.
A resposta a este problema, no meu ponto de vista, tem de passar por uma Lei especial para o financiamento da autarquia lisboeta e não pode, naturalmente, deixar de taxar os cidadãos de mais elevados rendimentos, bem como os proprietários de imóveis e lugares de estacionamento… principalmente daqueles que nem sequer lhes dão um uso socialmente útil.
Concordo contigo no essencial, mas estou em total desacordo numa questão macroeconómica que acaba por ser também política municipal.
ResponderEliminarDiscordo completamente quando dizes que "pergunta que a esquerda deveria fazer era se determinado imposto é ou não progressivo". Todos os impostos criam distorções (boas e más), e muita da política económica passa pela escolha certa dos impostos. A redistribuição de riqueza deve ficar exclusivamente pelo IRS, que é que o que tem menos distorções noutros campos.
Um exemplo excelente, acaba por ser o IMI. Não devemos olhar para IMI do ponto de vista redistributivo (até porque, ao contrário do IRS, não é grande instrumento por haver "pobres" com casa própria e "ricos" com casa arrendada), mas exclusivamente do ponto de vista de política habitacional. Não me chocaria nada que o IMI para os devolutos fosse 10 ou 20 vezes maior que para os fogos ocupados, numa lógica de combate à especulação, de não esvaziamento da cidade, de usufruto dos equipamentos sociais que já existem no centro mas não nas periferias, etc. etc.
Sei que concordas comigo neste ponto final, e por isso fico sem perceber porque achas que a esquerda deve olhar para os impostos do ponto de vista redistributivo.
Naturalmente que não acho que a única função dos impostos seja a redistribuição da riqueza (e um bom exemplo disso, como apontas, será a defesa de uma penalização muito séria para quem tenha propriedade devoluta - mesmo que tenha pombos - no centro de Lisboa), mas é obviamente uma questão extremamente importante para mim, comunista, interessado no tema da Igualdade.
ResponderEliminarO IMI, como dizes, até pode não ser tão progressivo como o IRS, mas é óbvio que quem tem mais rendimentos, compra casas de maior valor em Lisboa e que quem tem menores rendimentos compra casas de valor inferior no Pinhal Novo. E quem tem muitos menos não compra sequer porque neste momento não lhe emprestam dinheiro...
De qualquer forma, o que está bom de ver aqui é que há uma unanimidade no discurso sobre o tema do "roubo fiscal" e é no meu campo político (Bloco, PCP), que existe o erro...É o espelho da impreparação e falta de experiência na Governação: Se a política desce mais à situação concreta, à medida específica, fica bem claro que as tiradas grandelequentes da(s) Assembleia(s), como por exemplo "António Costa é a Troika em Lisboa", para muito pouco servem...
Pior: continua por pensar e debater à esquerda toda uma mudança de paradigma do que deve ser o financiamento do Poder Local. E nesse novo sistema, creio eu, como se encontram soluções específicas para a especificidade da situação de Lisboa, que não pode receber financiamento pela mesma fórmula que Oeira...