A notícia de que o estacionamento por baixo do
Príncipe Real não vai mesmo avançar é uma excelente novidade para Lisboa. Mas continuando a ler a notícia,
fico na realidade triste com o que aparece. Diz o texto que "ainda assim, para
Carla Madeira [presidente da Junta de Freguesia], continua a existir a
necessidade de estacionamento naquela zona, pelo que defende a construção de um outro parque", seguindo-se uma discussão das possíveis localizações.
Nem me refiro ao anacronismo de a
maioria dos autarcas achar que é sempre preciso mais e mais
estacionamento, mas algo pior e que abrange muito mais gente. Refiro-me à
ideia, muito entranhada entre nós basta falar com um autarca ou ler as
discussões sobre a cidade, que cabe às autarquias providenciar
estacionamento. Reparem, há imensas pessoas sem casa, mas as autarquias
tem um papel limitado na habitação. Há imensas pessoas desempregadas,
mas as autarquias não estão a criar emprego. Há pessoas a passar fome,
mas ninguém acha que a culpa é das câmaras e juntas.
Há tarefas que pela sua natureza têm de
passar por uma entidade pública central, como licenciamentos, inspeções,
iluminação, esgotos, limpeza urbana, etc. mas o estacionamento não é um
desses casos. Não me refiro ao estacionamento na via pública, que
obviamente tem de ser gerido por uma entidade pública, mas ao
estacionamento construído de raiz, seja em subterrâneos
ou silos, que é o que está em causa. Nada proíbe um privado de
construir e operar um estacionamento, como aliás se comprova pela
existência de alguns* na zona referida.
Não está em causa uma escolha política
de esquerda vs. direita, de mais serviços providenciados pelo Estado vs.
pelo mercado, mas um problema de prioridades sociais. É
assumido por todos que o emprego, a alimentação e a habitação são
tarefas que podem ser entregues na sua quase totalidade ao mercado, mas
cabe ao Estado garantir a "habitação para os automóveis".
*O facto de serem em número reduzido, prova que o estacionamento é subsidiado nas nossas cidades.
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