A CML recorreu da decisão do Tribunal Administrativo sobre a obrigatoriedade de ceder ao jornalista António Cerejo, e portanto tornar público, o relatório do Vereador Nunes da Silva, elaborado em 2011, sobre a contratação pública na Câmara.
Independentemente do relatório em si, os termos em que está redigido o recurso da CML é todo um notável Manifesto sobre a relação do Estado, dos políticos e da Administração Pública com os cidadãos.
«Trata-se de proteger a reserva das discussões e documentos de cariz político que outra utilidade não têm do que ajudar na tomada de decisões e opções, essas sim públicas», diz o recurso.
Esta visão da Câmara ou do Estado, como uma entidade fortemente autonomizada, uma espécie de máquina fechada, composta por especialistas e meios capazes de produzir o melhor produto final possível para os cidadãos consumirem e calarem, é um flagelo em Lisboa e em muitos e muitos sectores do aparelho de estado. Um flagelo que origina fenómenos como a pequena corrupção e o tráfico de influências, mas também está relacionado com a própria falta de eficácia da "máquina do Estado", excesso de burocracia, uma Administração pouco vocacionada e focalizada em servir os cidadãos, resolver os seus problemas, responder aos seus desafios.
Quer isto dizer que não ponho toda a responsabilidade em António Costa, como faz Cerejo, mas alargo a crítica a toda uma Cultura instalada no aparelho de estado, dos responsáveis políticos aos Dirigentes e quadros da Administração, em vários níveis, de opacidade, inacessibilidade e mesmo de falta de transparência.
No entanto, naturalmente, o Executivo não pode deixar de ser alvo de críticas concretas.
O Vereador Nunes da Silva, independentemente de ter ou não razão nas criticas que fez no seu relatório de 2011, foi incómodo e levantou uma série de questões que se já se puseram a muitas pessoas: porque é que há tantos ajustes directos? Porque é que é que não há maior diversidade de fornecedores? Porque é que são tão vulgares os "trabalhos a mais" e a derrapagem de orçamentos?
Recorrer neste momento da decisão do Tribunal Administrativo, serve só para adiar, para depois das eleições autárquicas, a divulgação do relatório, obstaculizando o debate em torno de uma série de questões que são polémicas e muito importantes de serem debatidas entre todos os lisboetas.
Não fica bem, a quem encheu Lisboa de outdoors a dizer "PARTICIPE".
Pois é. Não fica bem não. E de facto mostra os telhados de vidro de algum marketing político.
ResponderEliminarÁlvaro